terça-feira, 24 de abril de 2012

August Courbet- Femme á la Vague


Pecado da carne


  Antes pecar que arder em silêncio perante a cama carbonizada pelos corpos frios de pessoas frias, isso não é como a água que se molda ao recipiente pressuposto, mas sim como aquele bloco de gelo que se derrete para se adaptar ao recipiente. Findar o que já havia acabado, era essa a ideia de destino, nascer, crescer e servir de alimentos para vermes nojentos, mas caro leitor, eu ainda digo-lhes que é melhor pecar que arder em silêncio. Digam-me, o que seria da dor sem o gemido, o que seria do sexo sem o gemido, o que seria da tristeza sem o gemido? Gemer, gemer, conclusão um tanto acuada quando se pensa na morte, e digam-me, como não gemer quando se está morrendo? Uma murmura de prazer carnal, não é nenhum pouco apelativo quando se trata de bálsamos ao invés de corpos suculentos. Oferecem refeições extravagantes e fartas. Nesse meu diário secreto onde, por hora, não há mais de ser um segredo, eu vos digo que canibalismo não há mais de ser a refeição do diabo. Eu as execrava sob minhas curvas quase que mortais, me alimentar de carne não é barato, e assim me farto e ponho tudo para fora, e depois como de novo.  O eflúvio de sensações que sai da pele de cada um é a emanação de nossas almas. Elas que por sua vez dançam e dançam enquanto dormimos o sono da orgia. Pelas ruas que passei observei que a tristeza sucumbiu os desejos carnais, prostitutas em ruas vastas e medonhas prontas pra se abrirem a qualquer preço e a qualquer um. Mulheres, talvez fossem seres perfeitos se não lhes faltassem algo entre as pernas. Algo que outras tinham de sobra, botões a serem abertos e costurados de volta para que cada depravação fosse única, não tinham sorrisos sinceros nem olhares sedutores verdadeiros. A única verdade era sua matéria viscosa, peles secas e mal tratadas, e engana-se quem acha que a água celeste se atreveria a toca-las. A cada ida ao inferno um sinal bendito era feito, “ Que Deus me proteja “
                                                                                                                                                                 

                                                                                                                      Maika Rosseau

sábado, 21 de abril de 2012

Edward Munch - Pain



As ruas da cidade morta


-Caminhando pelas ruas vazias, eu me sentia como se a rua tivesse entupido de pessoas que me sufocavam e me tiravam a tranquilidade, e que de tão cheia não deixava o vento me tocar. Queimando até a morte, assim era o nome de uma rua a qual eu andava todos os dias e mesmo assim não sabia onde ela daria, pois tinha medo de saber onde levava. Lembro-me que em todo esse tempo que vivo aqui nessa cidade tão morta a única vez que vi outro ser vivo foi há uns meses atrás, um cachorro pra ser mais especifica, ele estava deitado no chão, gemia e gemia o gemido que me fazia sentir toda sua dor e todo seu desespero, ele estava com seu corpo queimado e a carne tinha cheiro de podre, e em um desvio rápido observei que ele mesmo estava a comer suas próprias tripas e o gemido se tronou uma audição de prazer e satisfação. Sai correndo e com lagrimas nos meus olhos perturbados e arregalados, minha respiração mal acompanhava meu ritmo. É enlouquecedor como as pessoas me faziam falta, não por serem objetos de satisfação pessoal, mas sim por preencherem o vazio que as ruas da cidade morta tinha, os carros vazios e enferrujados, lojas com seus vidros quebrados e papeis e sujeiras ao chão, essa era a imagem que eu via todos os dias. Nem o sol se atrevia a aparecer e me banhar com sua luz e se ao menos se mostrasse, eu saberia que haveria esperança, mas nem isso ele fez por mim. Olhem só pra mim! Estou chamando o sol de “ele”, como se fosse alguém, estou sozinha demais, eu entendo, mas o que eu posso fazer se preciso de algo em que me segurar? Eu quero e preciso de esperança. Estou me alimentando do ar, e bebo minha saliva acumulada, mas minha sede é de calor humano e de atenção humana. Estou entrando nas lojas quebradas e sem mais clientes, apenas eu e o vácuo que por hora se estabiliza no meio. As ruas vazias fazem barulhos, o vento quando bate nos carros ou algum obstáculo é como se assobiassem e em seus assovios eu danço e danço, movo-me só, canto só, vivo só, como é trágico não ter pra quem se mostrar, ou pra quem se vender e doar. Quando a rua não sai de mim, pego um agasalho e protejo-me de todo aquele frio que o calor humano privava. Quero vender minha alma, mas minha alma não tem a quem ser vendida, talvez uma pedra no meu caminho ou um ferro enferrujado queira minha alma em troca de um pouco de sentimento. As ruas daquela cidade morta me matavam todos os dias, todos os dias zombavam de mim, todos os dias me mostravam como era estar só no mundo.

Maika Rosseau